Segundo
Pasqualini[1], existem
duas atitudes nocivas à hermenêutica: a ilusão dogmática e a indiferença
cética. Contra elas, ele propõe um relativismo hermenêutico, que teria o condão
de trazer para os níveis do diálogo e do discurso todas as boas interpretações,
criando elementos para se escolher entre as melhores, num processo ascendente. Será
que ele tem razão?
A primeira
atitude, a dogmática, consiste na crença em algum ponto doutrinário absoluto:
as coisas são assim e pronto. Significa, pois, uma decisão prévia sobre
determinado tema, um pressuposto taxativo, um ponto de partida imodificável. Há uma verdade fundamental, uma premissa inquestionável, a partir da qual se desenvolverá toda a trama argumentativa. Naquele
quesito em particular, o dogmático não interpreta: a coisa já está interpretada
de antemão, e ele agora procurará interpretar tudo o mais a partir daquela
suposta verdade em sua mão.
A segunda
atitude, a cética, representa um ponto de partida negativo: nenhuma
interpretação atinge o cerne da questão, a intenção do autor, o sentido do
conceito, a natureza da coisa, a essência do valor em debate. Interpretar é
sempre fracassar, pois é projetar um panorama subjetivo sobre uma realidade
objetiva totalmente diferente dele. Toda interpretação seria uma
arbitrariedade.
Das duas
atitudes, a primeira possui marcada tendência à ilusão, ao passo que a segunda pretende-se
desiludida – embora seja vítima de uma ilusão ao avesso, negativa. Nem verdade
total, nem verdade nula: os homens se movimentam no horizonte fluido de
verdades parciais, relativas, erros provisórios, algumas definitividades,
obviedades indiscutíveis, fantasias, crenças plausíveis e muitas outras coisas.
Assim, é sempre possível interpretar melhor, aprender mais, errar menos na
análise de algo. Mas, como?
Um com caminho
para isto reside no apontado relativismo hermenêutico: se as verdades, e com
elas as interpretações, são relativas, as melhores são aquelas com maior grau
de relatividade, ou seja, de referência ao contexto, ao sistema de
referenciais. Uma verdade isolada é menos verdadeira do que outra que dialoga
com os demais conhecimentos do sue horizonte cultural e epistemológico.
De igual modo,
uma interpretação mais consistente é aquela que é capaz de dialogar com outras
do seu horizonte cultural, apreendendo-lhes as virtualidades e sendo capaz de
detectar e ultrapassar suas limitações. Tarefa imensa, e sempre recomeçável. Garantia
de emprego para o hermeneuta.
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