Mente Zen, Mente de Principiante (Resumo) - Parte I - Prática Correta


Mente de Principiante

1 Há muitas possibilidades na mente do principiante, poucas na do perito.
2 É difícil praticar o Zen, não pela técnica ou iluminação, mas por ser difícil manter a mente e a prática puras.
3 Shoshin significa mente original, mente de principiante. Sempre rica e auto-suficiente. Vazia, aberta, alerta, pronta para tudo.
4 Para o estudante, o mais difícil é mantê-la. É não se tornar dualista
5 Discriminar, exigir, ansiar demais é perder shoshin. E acabar violando os preceitos: não mentir, roubar, etc.
6. Em shoshin não há pensamento egocentrado, do tipo: eu alcancei isto. Ele limita a vastidão da mente
7 Shoshin pode aprender tudo. Shoshin é mente de compaixão. Ilimitada
8 Shoshin é verdadeira consigo, está em comunhão com os outros, e pode praticar.
9 Não requer profunda compreensão ou muita leitura. Mas Mente virgem.

Primeira Parte – Prática correta

Postura

1 Na posição de lótus, se exprime a unidade na dualidade. Duas pernas como uma. Nem dois nem um.
2 Mente e corpo: nem dois, nem um.
3 Dois e um ao mesmo tempo. Plural e singular. Dependente e independente.
4 Coluna reta, queixo levemente retraído, diafragma contraído em direção ao hara, mãos formando o mudra cósmico com os polegares à altura do umbigo. Como quem segura algo muito precioso.
5 Braços livres, relaxados, ligeiramente afastados do tronco.
6 Firme como quem está sustentando o céu sobre a cabeça.
7 A postura não é meio para um estado mental correto. A postura correta é já o estado correto, é já o propósito da prática.
8 Não precisa buscar nenhum estado. Nada. Mate o Buda.
9. Fazer algo é expressar nossa natureza. As regras existem para cada um se expressar através delas de seu modo único.
10 Usualmente, tentamos mudar as coisas em vez de a nós mesmos. Mas sem nos mudar, não dá.
11 Quando fazemos a coisa certa no tempo oportuno, tudo se organiza.
12 Manter a postura em todas as atividades. Sem ela, não se tem lucidez. Este é o ensinamento.
13 É preciso alimentar o cérebro. Mas mais importante é ser você mesmo praticando a forma correta de viver.
14 Ao se encontrar, Buda viu que tudo tem natureza búdica.
15 Iluminação não é sensação especial ou estado mental. É postura correta e prática correta.

Respiração

1 Quando inalamos, trazemos ar pro mundo interior. Quando expiramos, levamos para o mundo exterior. Mas há só um mundo.
2 Se você diz 'eu respiro', o eu está a mais aí. O eu é como a gargante, uma porta para o vai e vem, que se move quando respiramos.
3 Quando a mente está calma, a garganta se move, mas o eu não. Não há eu a mover-se.
4 Há aí pura consciência do movimento da respiração. E com ela, saímos da consciência do eu pequeno para a da natureza universal ou de Buda.
5 Isto não é nem compreensão, mas a experiência da vida através da prática do zazen.
6 Sentar-se cônscio da atividade do Universo
7 Não há tempo e espaço, mas tudo é aqui e agora. Não há desejo de estar fora ou noutro tempo.
8 Não há bom e mau. Há o que fazer agora. E o que não fazer.

Controle

1 Viver o reino de Buda é morrer a cada momento.
2 Morrer é perder o equilíbrio. Mas isto é evoluir. Tornar-se mais belo e perfeito.
3 Pintura japonesa antiga: pontos em desordem de forma artística. Moderna: formal.
4 É difícil criar em desordem, fora de alguma ordem. Tendemos a alguma ordem ou controle.
5 É impossível controlar as pessoas. A melhor forma é deixá-las à vontade.
6. Dar a sua ovelha e vaca um pasto grande é mantê-las sob controle.
7 Nem ignorar as pessoas nem controlá-las: observá-las.
8 O mesmo quanto a si: não adianta controlar os pensamentos durante o zazen. Observar.
9 Não tentar concentrar a mente. Observar a respiração é simplesmente ver as coisas como são e seguir o seu curso.
10 Sair da mente pequena para a mente grande, que é o Todo.

As Ondas Mentais

1 Não tente deter seu pensamento. Deixe que ele pare por si mesmo.
2 Tentar parar significa estar sendo incomodado por ele
3 Nada que incomoda vem de fora. Vem de dentro, das ondas da mente.
4 A mente livre e calma é a mente grande. A mente agitada e presa a algo fora é a mente pequena.
5 Tudo está dentro da mente grande. Experimentá-la é o sentimento religioso.
6 Água e ondas são uma coisa só. Inseparáveis. Mente grande e pequena também.
7 Uma mente que não espera nada de fora é uma mente completa
8 A mente grande aceita toda experiência. Não há medo da morte ou do sofrimento, lugar a ir, etc.
9 Também não precisamos ir em busca de uma alegria excessiva.

As Ervas Daninhas da mente

1 Não é fácil despertar cedo pra meditar na postura correta. Mas persistindo, as ondas mentais diminuem e o esforço se torna um sentimento sutil.
2 As mesmas ondas que surgem vão ajudar a acalmar.
3 Alimenta-se as plantas arrancando as ervas daninhas e as enterrando ali junto.
4 As ervas daninhas viram alimento mental. Isto é auto-alimentação.
5 Nenhum esforço beneficia a prática, pois produz ondas na mente.
6 Mas é impossível obter serenidade mental sem algum tipo de esforço.
7 Temos que esforçar mas esquecermos de nós mesmos durante. Sem objetividade nem subjetividade.
8 Mente calma, sem ter nem consciência disto.
9 Esforçar-se até o momento que o esforço desaparece.
10 Focar na respiração até esquecer a própria respiração.
11 Persistir no esforço, mas sem almejar o estado posterior de não esforço.
12 Apenas focar na respiração. O esforço, inicialmente grosseiro, se torna cada vez mais puro.
13 Ao aprender o poder de purificar a si mesmo e ao que me rodeia, aprendo com todos e me torno amável com todos.




O Cerne do Zen
1 Há um sutra que diz: existem quatro cavalos, excelentes, bons, fracos e maus.
1,1 Os primeiros cavalgam veloz ou devagar sem nem ver a sombra do chicote.
1,2 Os bons, antes que o chicote chegue.
1,3 Os fracos, só quando sentem a dor do chicote.
1,4 Os maus, só quando a dor já chegou à medula dos ossos.
2 Se você acha que o Zen é para treiná-lo a ser o melhor cavalo, entendeu errado.
3 Praticando certo, não lhe importa que cavalo você é
4 E se você for a compaixão do Buda, sentirá mais simpatia pelo pior que pelo melhor.
5 Ao praticar zazen com a mente do Buda, verás que o pior cavalo é o mais valioso.
6 Nas imperfeições acharás a base da mente resoluta que busca o caminho.
7 Os que se sentam com perfeição física demoram mais tempo a alcançar o Zen.
8 Os que têm mais dificuldade, encontrarão nele mais sentido.
9 Os melhores calígrafos não são os mais habilidosos com as mãos. Estes encontram dificuldades após atingir certo estágio.
10 Shoshaku jushaku; engano contínuo, um erro atrás do outro. A vida de um mestre Zen. Que é também uma vida de esforço contínuo.
11 Um bom pai não é um bom pai. Aquele que pensa ser um mau pai está se esforçando sempre para melhorar.
12 Um pai com filho acamado de doença incurável se aflige e não descansa, sem poder fazer nada.
13 Para atenuar seu sofrimento mental, melhor seria sentar em zazen, mesmo em postura incorreta e em tamanha aflição
14 Se você não passou pela postura difícil de sentar numa posição como essa, não praticou zazen e nada poderá apaziguar seu sofrimento
15 Com o zazen longamente adquirido, o corpo e a mente aprender a aceitar as coisas como são
16 Quando estás contrariado, a melhor coisa a fazer é sentar-se. Não importa se sua postura é correta ou não, se você é o melhor ou pior cavalo.
17 Quando você se senta no meio do seu problema, você é mais real do que ele. Essa é sua força verdadeira, no agradável e no desagradável.

Não dualismo

1 A Prática deve ser feita sem ideia de expectativa, ganho, iluminação
2 Mas isto não é sentar-se sem propósito algum. O propósito é praticar e manter a prática.
3 Aferrar-se à ideia de que forma é vazio e vazio é forma é recair sutilmente no dualismo
3,1 Fará você, enquanto forma, tentar tornar-se vazio. Perceber-se forma aqui, e ver o vazio lá.
3,2 O Zen afirma que forma é forma e vazio e vazio. Não muda as coisas.
3,3, Mas para isso, a prática começa no estágio de forma é vazio e vazio é forma.
3,4 Quando você se unificar com seu objetivo, e o esforço desaparecer, passará além.
4. Deter a mente não é parar a mente. Mas impregnar todo o corpo com ela.
4,1 Sua mente respira com você. Forma o mudra com suas mãos.
4,2 Você se senta com as pernas doloridas sem se incomodar com elas. Senta-se sem nenhuma ideia de ganho.
5 Encontrar seu caminho em meio às restrições é o caminho da prática
6 Prática não é fazer qualquer coisa e achar que é zazen. É quando as restrições não o limitam.
7 Quem diz que qualquer prática importa por já ser búdica, já está no dualismo. Pois, se não importasse, nem seria preciso dizer isso.
8 Quem diz que não tem importância está justificando o fazer estas coisas com a mente pequena.
9 O zazen verdadeiro é realmente comer simplesmente ao estar comendo, respirar simplesmente ao estar respirando. E só.
9,1 Mas no início é difícil aceitar as coisas como elas são. Sentar-se com o incômodo e praticar com dor nas pernas ou sono.
10, Uma pessoa com diagnóstico terminal pode praticar zazen, tentando esvaziar a mente. Tentando se livrar do sofrimento da dualidade. Esta é a prática forma é vazio e vazio é forma.
11, Mas, se procurar viver cada dia e instante aproveitando, esta é a prática forma é forma e vazio é vazio.
12, Quando o Buda aparecer, você recebe. Quando o diabo aparecer, você recebe.
13 Para o iniciante, é preciso grande esforço
14, Mas é preciso persistir no caminho, até esquecer tudo sobre você mesmo.
15 Ao fazer algo, apenas fazê-lo deve ser seu único propósito.

Reverência

1 Após o zazen, fazemos nove prostrações. Reverenciar é abrir mão de nós mesmos.
2, É sair do dualismo. É respeitar algo mais valioso que nós mesmos.
3, Reverenciar o Buda sem ter uma ideia sobre o Buda é se tornar um com o Buda, é se tornar o próprio Buda, é se tornar um com tudo o que existe. É encontrar o verdadeiro significado de ser.
4, Tudo se torna o seu mestre, e tudo pode ser objeto de culto.
5 Homem e mulher, mestre e discípulos, humanos e animais, se reverenciam mutuamente.
6, Acabam as distinções
7, Um mestre que não pode reverenciar um discípulo não pode fazê-lo com o Buda.
8, Na mente grande cabem todos os seres, e tudo tem igual valor. Tudo é o Buda.
9, Aceitar as coisas como são é dedicar a todas elas o respeito que se tem ao Buda.
10, Deste modo, o Buda curva-se ao Buda através de você, e você a você através dele
11, Você reverencia a si mesmo de modo verdadeiro, percebendo-se um com tudo.
12, Reverencie verdadeiramente e todos os preceitos serão seus e tudo estará em sua mente grande
13, O mestre Rikyu, da cerimônia do chá, fazia tudo sem dualismo. Estava pronto a morrer a cada momento. Morria e renascia sempre. A cerimônia é uma grande reverência.
14, Curvar-se em reverência ajuda a limpar nossas ideias egocentradas.
15, O resultado não importa. O esforço é que é precioso. E não acaba nunca.
16, A reverência nos quatro votos budistas
A, Embora os seres vivos sejam inumeráveis, eu me comprometo a salvá-los.
B, Embora meus desejos sejam inesgotáveis, eu me comprometo a me libertar deles.
C, Embora os ensinamentos sejam ilimitados, eu me comprometo a aprendê-los todos.
D, Embora o budismo seja inalcançável, eu me comprometo a atingi-lo.
17, Fazer o que é possível não é o budismo.
18, Quando nos esforçamos pelos votos, nossos desejos mais profundos são apaziguados, e isto é o nirvana.
19, Calma não é cessar as atividades. Calma nelas é que é a verdadeira calma.
20, Após certo tempo, você vê que não dá pra progredir rápido. É sempre aos poucos.
21, Se tive uma ideia formada de progresso, achará enorme lentidão.
22, Não há um parâmetro, como se sabe estar molhado assim que se entra no chuveiro
23, Desistindo de medir o esforço ou de aumentá-lo, o esforço se concentra no instante.

Nada Especial

1, Zazen é maravilhoso. Não há outra prática além dessa. É a nossa verdadeira natureza.
2, Mas não é nada especial.
3, Quando pensamos: "estou fazendo algo", ou, "preciso atingir isto', não estamos fazendo nada.
4, Quando renunciamos, quando não desejamos, quando não tentamos fazer algo especial, aí estamos fazendo alguma coisa.
5, Não há ideia de ganho, nenhum objetivo.
6, A iluminação é uma experiência maravilhosa para aqueles que não a tiveram, e comum para quem chegou lá.
7, É nada, e ao mesmo tempo é algo.
8, Ao expressar nossa verdadeira natureza, somos seres humanos. Quando não, não sabemos o que somos. Existimos, mas ainda não somos humanos
9, Quando o Zen não é ainda o Zen, nada existe.
10, Tudo o que é verdadeiramente expressa sua própria natureza. Sua natureza de Buda.

11, Praticar zazen sem finalidade alguma, apenas reassumindo sua verdadeira natureza.  

Um comentário:

Anônimo disse...

ótimo texto. continue com o bom trabalho