Há alguns dias, li um texto a princípio interessante, e até bem escrito (coisa rara por aqui), defendendo a causa da mulher engraçada, da mulher comum, da mulher cotidiana, da mulher de verdade. Pra ser sincero, sorri e concordei com a bela lição de aceitarmos nossa pequena (ou não pequena) com seus defeitos, imperfeições, finitudes e insuficiências, numa palavra: com sua humanidade. Exigir da mulher o alcance e conservação de não sei qual arquétipo metafísico de beleza é coisa cruel, e mais, ilegítima, pois nós homens não nos dispomos a fazer o que tão facilmente exigimos. Até aí tudo bem.
Mas, para criar o estereótipo da "feinha legal, inteligente e boa", não há que se criar e demonizar a imagem oposta da "bela estúpida e má". Chega do velho dualismo do bem e do mal, do isto-ou-aquilo, do vermelho-ou-verde. Chega desta idéia de rebaixar o outro para elevar-se, chega de não se dar ao esforço de subir! Há, de fato, a bela mulher desprovida de ternura, de encanto, de virtude, de mérito. Há, de fato, a mulher não bela (aos teus olhos) mas gentil, amável, companheira e tudo o mais. Mas vá a uma universidade: lá verás uma multidão de meninas esforçadas, inteligentes, meticulosas, e (que bom!) lindas, cada qual do seu jeito, cada qual a um certo olhar ou gosto. E vá também a uma academia: lá verás muitas universitárias, empreendendo o hercúleo esforço de conciliar a luta cotidiana, a tarefa de edificar o porvir, e a busca de tornar-se tão bela, jovial, saudável e feliz o quão a vida lhes permita ser.
Depois disto, retorne à universidade. Lá verás (espero não muitas) mulheres intelectuais, geniais, conscientes do seu talento, a se embrenharem na sedução da competitividade masculina, a arquitetar planos de subida fácil, a esquecer valores éticos, a calcular parceiros ideais, a ensaiar o senso de humor e a doçura da mulher que elas não são. Elas disputam em número (e em estupidez) com aqueloutras (que, de fato existem): as (assim julgadas) fúteis da academia e do salão.
Aliás, utilizei os ambientes estereotipados da universidade e da malhação (duas "Academias"), como pano de fundo. Há mulheres especiais (e as que precisam voltar a sê-lo) em todos os demais recantos deste mundículo.
Porém, mesmo estas últimas merecem o profundo respeito de nós outros (e outras), pelo simples fato duplo de serem mulher e gente. Mais ainda: por serem as primeiras (e indefesas, porque inconscientes) vítimas da nossa sociedade machista, que quer o bibelô doméstico, o troféu andante do homem bem-sucedido, a filha do grande pai. Mas elas também trazem suas dores, suas esperanças frustradas, seus sonhos de ventura, e, por que não?, o seu direito a serem felizes, do jeito que lhes fora ensinado a serem.
Finalmente: lembrem-se das belas e esforçadas, que já partem com o ônus de provar o contrário, de quebrar a aparência desfavorável, a presunção de futilidade, estupidez e tudo o mais. Também estas merecem que abandonemos esta polarização ridícula entre a bonitinha e a mulher de verdade.
Mulheres de verdade, busquem aprimorar-se no espírito e na carne! Sejam inteiras! Sejam leais com suas congêneres! Ajudem-nas a serem tão belas quanto possam ser, tão doces quanto lhes permita a vida, tão sábias quanto o breve tempo de caminhada neste mundo lhes enseje e torne. Aceitem suas imperfeições, mas busquem sempre a meta: mais beleza, mais sabedoria, mas doçura, mais humanidade. E lembrem-se: mulher alguma é melancia.
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