O aparente absurdo da implicação material

O conceito de implicação lógica (implicação material), embora seja simplório a princípio, provoca incompreensões quando visualizado sob a forma de certos expedientes lógicos, como a tabela-verdade. Nestas ocasiões, ele se torna a fonte de alguns paradoxos aparentes, que parecem injustificá-lo completamente em face da realidade como tal e do mediano bom-senso, de modo que se faz necessário bem compreendê-lo para melhor distingui-lo.



“Implicação lógica” significa uma única coisa: o seguimento necessário de uma proposição dita consequente a uma outra proposição dita antecedente. Sua forma lógica é, pois: “Se A, então B”. Disto decorre (por implicação, aliás) que esta relação inter-proposicional só não se verifica quando o antecedente é dado e o consequente a ele não se segue. Portanto, ele será válido nas ocasiões em que:



a) Ocorrer o antecedente e a ele seguir-se o consequente. Assim, para a implicação: “Se chove, eu fico em casa”, se ocorrem (ou seja, se recebem o valor “verdadeiro”) tanto a proposição “chove” quanto a proposição “eu fico em casa”, a condição está satisfeita. Esta é a hipótese mais clara, diretamente decorrente da definição. Ocorrem a condição e o condicionado.


b) Não ocorrer o antecedente e ocorrer o consequente: “não choveu, e eu fiquei em casa”. Neste caso, a não-ocorrência do antecedente não invalida o argumento, que preceitua não a necessidade de ocorrer o antecedente, mas a de seguir-se o consequente caso ele ocorra. Ou seja, a ocorrência isolada do consequente não viola a condição. A condição só pode ser violada se sua hipótese ocorrer, e sua prescrição não se verificar.



c) Não ocorrer nem o antecedente nem o consequente: “não choveu e eu não fiquei em casa”. Não ocorrem nem a condição, nem o condicionado, mas a condição continua vigente, já que não ocorreu a sua hipótese, razão pela qual não há violação da condição.


A rigor, somente no primeiro caso, tem-se, de fato, uma implicação verdadeira, uma conclusão verdadeira a partir de uma relação de implicação válida. Nos outros dois exemplos, tem-se uma ausência de implicação, a qual não é nem verdadeira, nem falsa.



Veja-se, portanto, que não há implicação quanto o antecedente não é dado, isto é, quando ele recebe valor de verdade “falso”. Por conseguinte, só haverá implicação (verdadeira ou falsa), quando ele for dado, e a ele se seguir ou não o consequente.



É justamente em razão do acima dito que o antecedente falso implica qualquer enunciado: no fim das contas, a implicação real decorrerá tranquilamente de uma versão traduzida do argumento, com valor de verdade “verdade”. Assim, se traduzirmos a implicação “se chove eu fico em casa” para a forma equivalente “se não chove, eu fico ou não fico em casa”, verifica-se que o antecedente negativo satisfará sempre a condição, independentemente do valor de verdade do consequente (já que o consequente é disjuntivo).



Este exemplo, no entanto, torna-se estranho diante de implicações não triviais, como no caso: “se o sol é feito de água, então eu não sou o presidente”, cuja versão traduzida é “se o sol não é feito de água, eu sou ou não sou o presidente”. A estranheza, no entanto, logo se esvai quando se atenta que não é da proposição “o sol é feito de água” que decorrerá a consequencia, mas da falsidade da proposição. Um antecedente negativo verdadeiro é versão traduzida de um antecedente positivo falso; é desta falsidade que decorrerá a verdade de qualquer consequente.



O mesmo se aplica ao consequente verdadeiro: ele é implicável de qualquer antecedente não pelo teor do seu enunciado, mas pelo seu valor de verdade; afinal, tanto na versão original quando na versão traduzida de uma implicação, ele aparece como consequente.



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