A Nuvem do Não-Saber foi escrita para não ser lida por ninguém que não fosse o seu destinatário, ou a alguém que este confiasse por uma especialíssima razão.
Sobre o destinatário desta obra, bem como acerca do seu autor, nada sabemos de certo.
Todavia, nota-se que se trata de um místico e teólogo altamente experimentado na vida retirada e nas práticas espirituais que recomenda.
Não se trata, pois, de mera erudição livresca. Ele traça um caminho que já seguiu. Acompanhemo-lo.
Primeiro, comecemos destacando a razão pela qual o autor pediu restrição de acesso ao livro: só o deveria ler alguém “que se determinou com real vontade e total desejo, a seguir perfeitamente Cristo”.
O desejo é algo que pertence ao pensamento, à Theoria. Total desejo significa um pensamento completamente direcionado para Cristo.
A vontade é algo que pertence à ação, à Praxis. Real vontade significa uma ação completamente direcionada para Cristo.
A perfeição é algo que pertence à criação, à Poiesis. Seguir perfeitamente significa cumprir totalmente o desejo de seguir a Cristo pela realização plena da vontade.
As três possibilidades supremas da vida encontram-se entrelaçadas, portanto, no destino de seguir Cristo perfeitamente.
Não é o seguir de quem apenas pense acerca disto, mantendo a sua mente nestas regiões elevadas, sem que o seu corpo ou seu espírito se movam do lugar.
Também não é o seguir de quem apenas busque a imitatio Christi na forma externa da caridade emulada, valiosíssima neste mundo cheio de aflição, mas que falta à caridade para consigo mesmo, a caridade de dar a si mesmo a chance de viver à luz da presença do Cristo.
Se não for o seguir de quem pensa e age conforme o Cristo, não há como fazer da sua vida uma criação genuína, uma autêntica obra cristã. Permanecerá no limiar do templo, como arauto da Boa Nova, que anuncia o anúncio, mas sem o escutar.
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