Os
juristas criminais e os historiadores do direito penal costumam
compreender o processo histórico sinalizado por Foucault no primeiro
capítulo de Vigiar e Punir como uma mudança do modelo da "prevenção
geral" para o da "prevenção especial". Vejamos no
que isto consiste.
Prevenção
geral significa: a pena aplicada ao autor de um crime serve,
essencialmente, para dissuadir outros membros da sociedade em questão
a incorrerem na mesma prática delitiva. Portanto, a eficácia da
pena não se dirige tanto ao sujeito passivo da pena, mas à
coletividade. Ela previne que outras pessoas, em geral, recaiam na
mesma conduta.
Prevenção
especial, ou específica, é exatamente o oposto disto. A idéia
agora não é mais dirigir-se imediatamente ao coletivo social, mas
ao indivíduo como tal. A pena serve para dissuadir aquele indivíduo
de cometer novamente aquele delito. Destina-se especialmente a ele.
É
interessante notar que estas idéias, aparentemente abstratas,
acarretam consequencias muito diferentes na sua aplicação.
Num
modelo em que a intimidação coletiva é o foco crucial, quanto mais
desproporcional a punição, quanto mais severa e cruel vier a ser,
melhor será para impactar a consciência coletiva da reprovabilidade
daquela conduta. Em contrapartida, se o indivíduo é o alvo, uma
pena desproporcional perde a capacidade de o dissuadir: quem sabe que
há de receber uma pena igualmente severa pelo homicídio de uma
pessoa ou de várias não terá porque poupar os demais membros da
família do seu desafeto quando for assassiná-lo.
Do mesmo
modo, note-se que a pena de morte é mais propensa a causar comoção
social significativa, ao passo que a mesma, se inflingida ao sujeito,
poderá servir como retribuição definitiva ao mal por ele
praticado, mas jamais como forma de dissuadi-lo a novos crimes, já
que ele já não estará mais vivo para emendar sua conduta.
Neste
sentido, o recorte histórico analisado por Foucault é bastante
interessante, na medida em que mostra o momento da transição entre
o modelo da prevenção geral e o modelo da prevenção específica.
Evidentemente, há modelos mistos, a combinar um e outro, bem como
outras propostas alternativas – mas estes dois casos se destacam
por terem adquirido vigência histórica.
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