Heráclito 3. O Logos é o Fogo


       A tese da caráter logóico do real, isto é, a afirmação de que o Logos constitui uma espécie de estrutura ontológica profunda do real, ainda não diz nada a respeito de como as coisas se processem no âmbito da superfície. Há, portanto, que se analisar o modo como Heráclito 'sobe' da explicação do Logos para a explicação dos fenômenos por ele regidos. 

       Assim, passando da estrutura profunda da realidade (Logos) para a sua manifestação, como é que esta se dá? Haverá um mecanismo que a caracterize? Ou será que não faz sentido falar de mecanismo no cômputo da visão de mundo grega? Será que existe um elemento então, uma versão da velha Physis de Tales, Anaximandro e Anaxímenes, que se relacione de maneira fundamental com o Logos?  

      Heráclito dirá que sim. E indicará isto a partir de uma tese paradoxal, aparentemente absurda: o Logos é o Fogo. Mas, como? O Logos, estrutura profunda do real, identificado a uma das coisas que pertencem ao plano do aparecer, do manifestar? Logo o fogo, que é, em si mesmo, um processus em manifestação, a constante conversão de combustível em luz?

   Para Heráclito, não haverá contradição nenhuma. Ele ainda não está contaminado pelas distinções ontológicas rígidas, fossilizadas, que estabelecemos entre modos, graus ou espécies de ente. O Fogo, para ele, será como que uma presentificação fenomênica do Logos. Nenhum outro elemento do mundo seria mais adequado para o exprimir. O fogo é, essencialmente, manifestação, e o é perpetuamente. È fenômeno, conversão de combustível em chama, um vir-a-ser, um vir do nada à luz. É iluminação, um surgir que rasga a escuridão como o Logos irrompe no pensamento. Faz nascer muitas coisas, e perecer muitas outras. É o sol, fonte de vida e luz para os homens. 

       E, assim como o Pneuma Apeiron era o Ar Incorpóreo e Infinito de Anaxímenes, o Logos será o Fogo Incorpóreo e Infinito de Heráclito, realidade viva, pulsante, que tudo cria e aniquila, que se auto-gera e se auto-alimenta. Por isso ele diz: “Este mundo (kosmo), o mesmo de todos os seres, nenhum deus o fez, nenhum homem o fez, mas é e será sempre um fogo sempre vivo, acendendo-se conforme a medida e apagando-se conforme a medida”.

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