Heisenberg contra Laplace: da causalidade atômica à indeterminação sistêmica

Por Thiago El-Chami


O princípio da causalidade, alicerce da física clássica, explicava as propriedades e configurações atuais dos fenômenos físicos a partir da série de causas que intervieram em sua formação. Desta maneira, nada no presente acontece sem que tenha uma origem no passado. O acaso, então, é somente o nome dado a uma causa que não se conhece.

Entretanto, em 1927, Werner Heisenberg afirmou que é impossível saber a posição e o momento (velocidade instantânea) de uma partícula, ao mesmo tempoi. Isto, porém, não se devia a uma ineficiência instrumental ou incapacidade humana, e sim a uma impossibilidade física. O aumento de precisão na observação da posição, perturbaria o momento da partícula, e vice-versa.

A conseqüência desta idéia consiste em que a observação epistemológica interfere ontologicamente no fenômeno observado. Deste modo, as propriedades dele decorrem, em parte, do ato cognoscitivo sob o qual ele se desenrola. Uma versão mais radical do princípio chega mesmo a afirmar que o elétron não possui posição ou momento até ser observado.

Esta concepção viola a tradicional visão dos processos físicos como sistemas determinísticos fechados, representada na famosa afirmação de Laplace:

"Uma inteligência que, num instante dado, conhecesse todas as forças de que a Natureza está animada e a situação respectiva dos seres que a compõem, se por outro lado ela fosse suficientemente vasta para submeter todos estes dados à análise, englobaria na mesma fórmula o movimento dos maiores corpos do universo e aqueles do mais leve átomo; nada seria incerto para esta inteligência, e tanto o futuro como o passado estaria presente aos seus olhos"ii.



i A rigor, é possível obter informação simultânea a respeito de ambas as quantidades, mas com considerável grau de incerteza. Na prática, o princípio da incerteza implica que "quanto mais exatamente for determinada a posição de uma partícula, menos será determinada a sua velocidade, e vice-versa". (HAWKING, 2002, p. 27).


ii MERLEAU-PONTY, Maurice. A natureza: curso do College de France. Trad. Álvaro Cabral. São Paulo; Martins Fontes, 2006, p. 142.

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