Em Busca de Deus

Caminhar para Deus: eis um desejo ardente que desperta em toda alma que, de alguma maneira, começa a se inquietar com as coisas deste mundo. Mesmo que ainda se deixe seduzir pelas coisas da Terra, chega uma hora em que algo começa a fazer falta. Mas, que algo é este?

Seria a lembrança de algo perdido, como a pureza da infância? Ou quem sabe, ansiamos pelo aconchego do ventre, cuja memória profunda a ciência psicológica afirma residir no âmago de cada um de nós? Talvez se trate de algo ainda mais longínquo, como a plenitude da vida espiritual, a proximidade de Deus, o descanso edênico no seio do Pai, antes de haver começado a epopéia de nossa jornada pela Matéria.

Infância, ventre, Céu: três avessos deste mundo, no qual existimos como adultos, vivemos premidos pela necessidade, e carregamos um corpo fadado à morte e à dor. Ressentimo-nos da falta da pureza em nós e à nossa volta. Afligimo-nos com os imensos cuidados do comer, do vestir, do dormir (e de mil outras coisas menos necessárias). Lamentamos carregar um corpo de carne tendente ao sono, à morte, ao cansaço, ao vício e à desintegração.

É bem verdade que nem só com aflições e lamentos ocupamos o nosso pensar e sentir. No mais das vezes, acostumamo-nos muito facilmente com as cores e os aromas deste nosso mundo humano. Orgulhamo-nos de nossa individualidade, sobretudo ao colhermos os frutos açucarados da ''realização'': profissional, financeira, social, intelectual. Satisfazemos a nossa egoidade com toda diligência, temperando com mil refinados prazeres cada necessidade a aplacar. Identificamo-nos completamente com a nossa corporeidade, dispendendo significativa parcela do nosso tempo a embelezar a face, a suavizar a pele, a enrijecer o porte, a fazer crescer o músculo, a fazer brilhar a veste. Como é bom estar adulto, ser um ego, ter um corpo!

Contudo, inevitavelmente a ciranda da vida não tarda em nos apresentar os problemas da vida (adulta), as dores da consciência (egóica) e os males da saúde (corporal). O indivíduo se reconhece limitado, o ego se percebe frágil, o corpo se sente exangue. Às realizações, se emparelham as frustrações. Aos prazeres, se ombreiam os vícios. Ao traço e à forma se ajuntam a ruga, a falha e a cicatriz.

Muitos, a esta altura, se darão conta, pela primeira vez, daquela tripla inquietação. Outros, mais atentos, perceberão que ela sempre esteve ali, embora sufocada, como uma espécie de monótono ruído ao fundo, como o de um ar condicionado.

Alguns outros, que não experimentaram uma infância feliz, uma gestação tranquila ou a fé no transcendente, talvez convivam com algumas destas inquietações desde sempre ou desde cedo.

Todas estes elementos encontram parte importante de sua explicação nos mecanismos psicológicos, nos circuitos fisiológicos, nos processos culturais. A nosso ver, porém, são sempre aspectos colaterais, elementos complementares, condições ensejadoras ou circunstâncias adicionais: no fundo de todas elas fala um anseio, o mais profundo anseio da alma humana: a falta de Deus e a busca por Ele.

Como buscá-lo, portanto? Começamos falando em caminhar. Mas, se Deus está em toda parte, sobretudo em nós, falar em Busca ou em Caminho soa como um paradoxo. Como Buscar o que já se tem? Como caminhar rumo ao que já sempre está aqui?

Trata-se, obviamente, de imagens, de metáforas indicativas de realidades espirituais que transcendem o nosso mundo das formas – tanto o mundo humano quanto a própria esfera mais ampla da Natureza, materialmente compreendida.

Falar em Busca sinaliza para uma atitude fundamental, de despertar e alimentar o Anseio. De não fugir àquela tripla inquietação. De não se acomodar com aquelas três satisfações. De compreender e aceitar aquelas três limitações.

Falar em Caminho aponta para ações concretas destinadas a concretizar e dinamizar o Anseio, passando a fazer-se o que até então não se fazia, deixando de fazer o que já deve ser deixado, tornando a fazer o que não se devia ter abandonado.

Esta singela tentativa de esclarecimento, todavia, não visa afastar a suspeita de paradoxo, indicada acima. Ao contrário, visa agora compreendê-la mais profundamente. Tenho a impressão de que toda metáfora material de uma realidade espiritual deve ser meditada em "mão e contramão", através da união de sentidos contrapostos.

A Busca, além do sentir falta, é também um não buscar o que é daninho, e sobretudo: um aprender a encontá-Lo em toda a parte.

O Caminho é tanto uma aventura quanto uma volta pra casa: a um só tempo, ida e retorno.

Dizem os grandes mestres da humanidade, aqueles que nos antecederam nesta Busca e em tal Caminho, que o resultado desta jornada é completamente diferente do que se pensa ao início.

Primeiro, porque não é um resultado final, mas a experiência de um eterno recomeço.

Segundo, porque se aprende a não desprezar nada e a não escolher nada: encontra-se Deus na alegria mais pura e na tristeza mais atroz, na serena contemplação e no operoso agir no mundo, no fundo da alma e na flor do corpo, na Luz e também na Treva.

Quem sabe, esta Busca e este Caminho nos tragam, como resultado, uma nova Infância, um novo Renascer, uma nova Criação?

Que Ele, pois, nos ajude, nesta tentativa de aprender a Buscar e a Caminhar.


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