1.3.
O Estado como realidade da Idéia ética
Pode parecer curioso que o Estado
apareça definido em Hegel, primeiramente, sob o prisma da Ética (mais exatamente,
da Moral Objetiva ou Eticidade) do que do ponto de vista político: “O Estado é
a realidade em ato da Idéia moral objetiva”[1].
O
Estado, para Hegel, é realidade em ato da Vida Ética, ou seja, sua realização –
pois nele a intersubjetividade, o verdadeiro relacionamento humano, o tratar o
outro como fim em si mesmo, encontra sua plena efetividade. Na família, se se
observa bem, o elemento ético é realidade potencial, ainda não realizada: os
familiares se tratam reciprocamente como fins em si mesmos por temor ou amor –
sendo que o temor é uma instância ainda pré-ética, totalmente condicionada a um
fator negativo, o mal a evitar; ao passo que o amor talvez já esteja para além
da Ética, como observância incondicional do bem do outro.
A
Sociedade civil, por seu turno, sequer potencialmente é ética: nela, há um
encolhimento do sentido do respeito intersubjetivo ao mínimo necessário à
convivência, pois que ali vigora o princípio de tratar o outro como meio de
satisfação da necessidade.
As
premissas hegelianas, a par de oferecerem um quadro conceptual diferencial
entre as três figuras – obviamente passível de discussão –, indicam também uma
série de critérios interessantes para julgar a realidade política e social
atual. Os povos nos quais vigora o princípio do temor ou a adesão carismática
(amorosa, empática) a um líder, estão situados (ou descendo a) um nível
político atrasado, pré-estatal; não por acaso, estes povos tendem a ser
governados por autocracias hereditárias.
Por
outro lado, sociedades nas quais os assuntos governamentais girem unicamente em
torno dos assuntos econômicos, e nos quais a Constituição se adstrinja a mero
roteiro de governabilidade, mera fixação de marcos regulatórios sumários, a
realidade ética pode estar sendo sobrepujada pelo sistema das carências, a
Liberdade pela Necessidade. É o caso dos países nos quais a política está
totalmente voltada para o presente, para urgências e emergências, governados
por medidas provisórias, decretos executivos, leis temporárias e criações
‘políticas afins’. Uma política voltada para os meios, para os recursos, para
as necessidades, padece de um encolhimento teleológico, e, por conseqüência,
ético, pois que o Ético é o reino dos fins.
Aliás,
neste mesmo sentido, Hegel dirá mais adiante, de modo verdadeiramente
profético: “Quando se confunde o Estado com a sociedade civil, destinando-o à segurança e proteção da propriedade e da
liberdade pessoais, o interesse dos indivíduos enquanto tais é o fim supremo
para que se reúnem, do que resulta ser facultativo ser membro de um Estado”[2].
Propriedade e liberdade (livre-iniciativa): fins da sociedade civil, fins do
capitalismo como tal.
Parte VI: http://paragensfilosoficas.blogspot.com.br/2013/09/realismo-em-hegel-idealismo-em-marx_543.html
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