As Razões de Aristóteles 16 - A ciência apodítica para além de verdade e falsidade

Enrico Berti, em seu estudo sobre a ciência não apodítica em Aristóteles, apresenta uma outra característica interessante da mesma, e que pode aparentar contradição com o senso comum e com a filosofia tradicional, a princípio: a idéia de que a inteligência, em suas proposições ou captações, está para além da verdade e da falsidade.

Pode parecer estranho que o noûs não se submeta ao crivo da verdade ou da falsidade. O lógos apodektikos, a razão demonstrativa, sofre com uma dupla constrição: ela precisa da validade e da verdade. Precisa da validade de sua demonstração, que deve seguir regras e assumir alguma das figuras silogísticas possíveis. E necessita da verdade de suas premissas, pois um raciocínio correto com premissas falsas não conduz à verdade.

E quanto ao noûs? Estaria ele dispensado da tarefa de assegurar a verdade de suas afirmações? Sim. Mas não porque a verdade lhe seja desimportante, e sim pelo fato de que ela já lhe está garantida. O noûs sempre apreende a verdade. O homem pode permanecer na ignorância de certa verdade fundamental, mas, quando ela se exibe a ele, ele a capta originariamente.

Assim, diferentemente da ciência apodítica, que pode ser julgada pelo cânone do verdadeiro e do falso, a ciência não apodítica o há de ser pelos critérios do conhecimento e da ignorância. Se ainda se ignora as verdades fundamentais, a inteligência ou intelecção do real ainda não se deu. Quando se tem as verdades, o conhecimento originário já se realizou.


Enquanto a ciência apodítica pode errar o alvo, a ciência não apodítica pode, somente, não atingir a verdade. Seu tiro é sempre certeiro, embora nem sempre lhe haja flecha. 

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