A definição de filosofia é tarefa das mais problemáticas. Nem os
cultores desta atividade pensante conseguem chegar a uma concepção que não seja
passível de crítica.
Neste caso, porém,
onde mora o perigo também mora o remédio. Assim, onde quer que encontremos uma
reflexão de natureza não linear, ambígua, e por vezes mesmo paradoxal também
estaremos diante de uma questão filosófica. De uma maneira preliminar, ainda
que questionável por esta ou aquela doutrina particular, podemos estabelecer um
critério diferenciador: a Filosofia cuida de princípios, a ciência de regras ou
leis, a religião de fins. A filosofia questiona pela Origem ou Criação, a
Ciência pelo meio, transformação, caminho ou afastamento desta origem, e a
religião pelo destino, pela morte, pelo retorno a esta origem.
Consideradas as
coisas a partir deste ângulo de observação, não se justifica a proposição,
tantas vezes defendida pelos pensadores do ocidente, de que a Filosofia é uma
criação do ocidente, e de que os maravilhosos sistemas de pensamento surgidos
no oriente Antigo não alcançaram a altitude da especulação teórica do Ocidente.
Para Hegel, que admirava profundamente os orientais, eles só conseguiram
exprimir a sua intuição do absoluto na forma de imagens e símbolos, não
tendo logrado a expressão através do
conceito e da Idéia. Para Heidegger, a Filosofia é grega por natureza, pois só os gregos teriam iniciado sem
precursores a reflexão sobre a questão do Ser, e se mantido na perspectiva
pensante por ela descortinada.
Evidentemente,
trata-se de um etnocentrismo exagerado negar caráter filosófico aos sistemas de
pensamento desenvolvidos sob cânones ou axiomas diversos daqueles encontrados
no Ocidente. O budismo Mahayana, o Vedanta, o Zen, o Taoísmo são exemplos de
escolas de pensamento altamente sofisticadas. Porém, se aqui entre nós as
coisas parecem ser mais claras no tocante à divisão entre filosofia, ciência e
religião, o mesmo não acontece nas doutrinas do oriente. Lá, o sentido de
unidade é mais forte, e idéias como a da polaridade yang-yin exprimem desde uma
teoria sobre a origem das coisas, como um ideal de virtude e equilíbrio morais,
mas também fornecem indicações sobre aplicações de técnicas médicas como
acumpuntura, e mesmo são estilizados em artes de Guerra como a doutrina de Sun
Tzu, e ainda, artes marciais como o kung fu.
Porém, uma reflexão
mais atenta nos mostrará que esta mesma observação se aplica a nossas doutrinas
ocidentais. Muitos dos conceitos que estruturaram a visão de mundo apresentada
na Metafísica de Aristóteles também estão presentes em sua Física, em sua
Biologia e em sua Psicologia. Nos filósofos cristãos, não se sabe com segurança
onde termina a filosofia e começa a religião, na forma da especulação
teológica. Na doutrina cartesiana, as constatações do matemático Descartes
serviram de base ao mecanicismo do filósofo Descartes. E o próprio Marx, que
declarou ser a religião um "ópio do povo", teve o irônico destino de
ser objeto de adoração fanática por alguns de seus seguidores.
Nenhum comentário:
Postar um comentário