Cezanne diz a Émile Bernard que, para aprender a ver por si mesmo, é preciso desenvolver uma ótica. 
Esta ótica seria uma espécie de lógica. Uma lógica do olhar. 
Por lógica, porém, não se entenda um manual de regras coercitivas, a disciplinar o olhar espontâneo fazendo-o perceber certas coisas. Cezanne entende lógica no sentido comum da expressão, enquanto o oposto do ''absurdo''.
Trata-se de um olhar ''sem nada de absurdo''. Não algo a mais (acréscimo de regras), mas algo a menos (sem acréscimos espúrios, de qualquer ordem). 
Talvez ele estivesse pensando na abolição de muitas das regras que o aprendizado da arte nos ateliês e oficinas impõe aos neófitos. 
Por certo, é quase impossível libertar-se totalmente dos modos viciados de olhar, das muitas regras inconscientes assimiladas no percurso. 
Talvez a originalidade de cada Mestre esteja no tipo de regras das quais soube se despir, e no modo como o fizera. 
Todavia, a história mostra que eles costumam substituir regras vigentes por novas regras. Ao menos, são regras pessoais. 
E é bem verdade que nem toda regra é um óbice à percepção do real. Nem todas são anteparos. Algumas são como lentes, como binóculos ou microscópios: alteram o panorama observável, acentuando aspectos do Real e ocultado outros. 
O que não se pode é utilizar as regras de modo irrefletido e impessoal. Seria como usar um microscópio no escuro total, ou tentar substituir os óculos cotidianos por binóculos de longo alcance. 
 
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