As Razões de Aristóteles 19 - Nous: não fulguração, mas fruto cultivado

A doutrina da imediateidade do Noûs, o seu caráter de intelecção direta do real, costuma levar a mal-entendidos relativos ao grau de facilidade ou dificuldade em exercê-lo adequadamente. Costuma-se pensar que toda imediatez implica ausência de esforço, naturalidade, espontaneidade, fulguração pura e simples da verdade.

Com isto, julga-se que todo esforço intelectivo metódico pertença a um tipo de saber secundário, derivado, em face do qual o saber de origem noética teria sempre a primazia.

Mais do que isto, crê-se que basta a pura atitude de expectação passiva para irrupções reveladoras descortinem o Noûs na forma de um pacote de verdades novas, como as manchetes de um jornal.

Trata-se, contudo, de um severo engano. O acesso à intelecção direta do real, em determinado campo do conhecimento (seja o da culinária, seja o da arte militar, seja o da filosofia primeira), há que se precedido por uma preparação adequada.

Até mesmo o escravo analfabeto, que Sócrates faz descobrir axiomas da geometria no Mênon de Platão, só o fez após ser preparado pelas perguntas adequadas que reelaboraram sua compreensão prévia daqueles elementos cujas relações fundamentais ele passou a inteligir após esta preparação.

Um exemplo da relação entre o logós e o noûs, no sentido da preparação que aquele é capaz de ensejar à irrupção deste, pode ser encontrado numa famosa asserção de Albert Einstein: “penso noventa e nove vezes,  e nada descubro; paro de pensar, e eis que a verdade me é revelada”.

O grande físico sabia da relação entre o esoforço intelectivo prévio, que explora todas as possibilidades de um problema, e a irrupção da nova compreensão resolutora, que desvenda o enigma então posto.

Sem o preparo adequado do logos apodektekos (que, no caso indicado por Einstein, não chegou a conclusões, mas quedou paralisado em impasses ou aporias) o noûs não irrompe.


Indagado sobre como descobriu a Lei da Gravitação Universal, Newton respondeu: “pensando nela”. 

Nenhum comentário: