Foucault - As Palavras e as Coisas - O Discurso da Natureza

Para Foucault, a História Natural não se dissocia da linguagem. Isto, porém, não em função de uma dependência visceral, não porque esta lhe forneça métodos ou conceitos, nem porque as duas sejam formas duma racionalidade mais geral, mas porque a disposição do saber ordenava o conhecimento dos seres pela possibilidade de representá-los num sistema de nomes.

O saber era então visto como um grande catálogo, um grande dicionário interconectado, onde cada conhecimento tinha o seu lugar, como cada nome numa árvore genealógica, ou cada estrutura nas modernas árvores sintáticas.

No caso da História Natural, trata-se mais de uma organização sistemática das formas do que de uma ciência geral da vida. Mas, será que se pode falar em presença de uma reflexão sobre a vida nos quadros de um saber sistemático desta espécie?

Houve, sim, a região da vida no pensar do século XVIII. Houve, sim, pesquisas além da classificação e análises além de diferenças e semelhanças, teorizações para além das comparações. Mas elas também eram permitidas no debate por um a priori histórico, por um certo fundo comum.

Esta episteme comum não é um equipamento de problemas e fenômenos instigantes, nem um saber sedimentado que facultasse vôos maiores, nem a mentalidade ou quadro de pensamento que reunisse interesses crenças e opções teóricas.

Este a priori é o que recorta na experiência um campo de saber possível, define o modo de ser dos objetos que aí surgem, arma o olhar cotidiano e condiciona o discurso.

Cada período histórico tem o seu saber paradigmático, que fornece a matriz e o ideal formal a ser perseguido pelos demais saberes.

No séc XVIII, este saber modelar, que serve de paradigma aos demais, é a História Natural. Contemporânea da linguagem, ela delimita o descritível e o ordenável, analisa as representações na lembrança, fixa identidades, signos e nomes.


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