Foucault - As Palavras e as Coisas - A Episteme e O mercantilismo

Para demonstrar sua tese a respeito da episteme clássica no tocante aos fatos que hoje reputamos econômicos, Foucault analisa o Mercantilismo. Para ele, enquanto o renascimento fundava as funções de medida e substituto no caráter intrinsecamente precioso do metal, o sec. XVII vê a função de troca como fundamento das aptidões para medir e receber preço.

Neste sentido, o mercantilismo faz da moeda a representação e análise das riquezas, se todo ser é caracterizável, pode entrar numa taxonomia, numa classificação, numa organização; se toda riqueza é monetizável, pode circular; todo indivíduo era nomeável e podia entrar numa linguagem articulada; toda representação era significável e podia entrar, para ser conhecida, num sistema de semelhanaçs e diferenças.

O círculo das similitudes e das marcas é rompido pelo da representação e seus signos, o do precioso, pelas riquezas e pelos desejos e necessidades, aquelas objeto destes.

Assim, só é riqueza o que tem utilidade ou necessidade, prazer ou raridade. O ouro é pouco útil; em relação ao uso possível, é abundante; logo, é por ser moeda, signo, é que é valioso, não o contrário.

Duas consequências daí decorrem: não é mais do metal, mas da moeda que vem o valor; e é na relação com as outras que as coisas assumem valor, valor que o metal apenas representa em sua imagem,  masnão constitui, da mesma forma que o signo não é coisa natural, mas convencional. As riquezas o são porque as estimamos, assim como nossas ideias o são porque as representamos.

Mas, por que ouro e prata? Por uma ‘perfeição própria’, sua capacidade indefinida de representação. São duros, imperecíveis, divisíveis em fragmentos, etc.

A relação é, pois, arbitrária, não vinda do valor intrínseco da coisa.

Critica-se, hoje, contradições no mercantilismo: ver a moeda como signo, mas sugerir acumulação. Porém, assim como os signos analisam as representações, mas são em si representações, a moeda não pode significar riquezas sem ser ela própria uma riqueza.

E observe-se o essencial: ela é riqueza por ser signo; seu valor intrínseco é seu curso e o valor imposto. Acumula-se pra trocar; não porque é precioso. A metáfora do sangue, da circulação das riquezas como a do sangue, tem aí sua razão se ser. Para Hobbes, o circuito venoso da moeda é o dos impostos e taxas, que subtraem certa massa metálica, que chega ao coração ou cofre do Leviatã, onde recebe o princípio vital.

Daí, se estimulará as trocas e fabricações e culturas. A linguagem e o ser entraram logo no esquema da representação; a moeda e a riqueza precisaram do mercantilismo, por seres instituições, representações sociais.


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