Boaventura
inicia a sua ‘Crítica da Razão Indolente’ apontando para um fato de suprema
relevância nos quadros civilizatórios: a transição entre paradigmas culturais
máximos.
Recorda
ele que tal transição não se dá ao modo de um lento suceder, através de um fio
contínuo de estados intermediários. Ao contrário, há descontinuidade absoluta
entre os paragidmas. Eles são incomensuráveis entre si.
Isto
significa, na prática, que aquilo que é pensado de certa maneira dentro de um
horizonte cultural não pode sê-lo em outro, da mesma forma. Às vezes, de forma
alguma. Por exemplo, com a assinatura de lei abolicionista, a posse de um ser
humano, que constituía direito absoluto no paradigma escravocrata, não só deixa
de ser direito, como, em alguns países, se tornou ilicitude punível.
Esta
afirmação recorda a doutrina proposta por Thomas Kuhn em seu livro ‘A estrutura
das revoluções científicas. Sua análise dos paradigmas científicos compartilha
a tese de que há descontinuidade nas transições, ainda que com uma fase
preparatória de sucessivos abalos ao paradigma velho, com anomalias,
dissidências, questões irrespondíveis e toda uma série de eventos e situações
que não se enquadram adequadamente no panorama possibilitado pelo velho
paradigma.
Ao
que tudo indica, aliás, talvez tenha sido em Kuhn que Boaventura buscou esta
importante chave de leitura do devir histórico-cultural.
Nenhum comentário:
Postar um comentário